Embora o Brasil tenha reduzido de forma drástica os números de contágio do
mal de Chagas nas últimas décadas, entre 150 e 200 novos casos ainda são
registrados anualmente. Mais de 95% ocorrem em apenas dois Estados: Pará e
Amapá, sendo o processamento de açaí e outros alimentos o principal foco de
contágio.
Os dados são do Ministério da Saúde, que aponta elementos da
cultura alimentar nortista, como as frutas, sucos e o alto consumo de açaí in
natura como fatores de difícil controle.
De acordo com o secretário de
Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde, João Barbosa, a doença está
controlada nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste, e há casos raros no
Nordeste.
No Norte, condições inadequadas de processamento e preparo de
alimentos fazem com que o inseto barbeiro (Triatoma infestans e suas variáveis)
ou suas fezes contendo o parasita Trypanosoma cruzi sejam ingeridas, levando à
contaminação.
"O inseto acaba caindo em máquinas de processamento de
alimentos, como moedores de cana. Frutas que não são esterilizadas da forma
correta também podem ter fezes contaminadas", diz João Carlos Pinto Dias, que já
chefiou o Programa Nacional de Combate à Doença de Chagas brasileiro e é membro
do Comitê de Doenças Tropicais Neglicenciadas da Organização Mundial da Saúde
(OMS).
Pinto Dias, que também atua como pesquisador da Fundação Oswaldo
Cruz e tem mais de 220 artigos científicos e sete livros publicados sobre o
assunto, diz que o Nordeste ainda abriga alguns resquícios de incidência do
barbeiro, mas que a maior preocupação é com o Pará, no Norte.
Segundo o
Ministério da Saúde, sabe-se que o açaí é o principal problema, e o governo já
montou um esquema de normatização sobre a esterilização da fruta, que inclui
procedimentos simples como a fervura da polpa, mas ainda há resistência nas
comunidades locais.
Erradicação
Embora o Brasil
tenha reduzido o número de novos casos anuais de Doença de Chagas de 150 mil nos
anos 1970 para cerca de 150 a 200 atualmente, não se pode falar em
erradicação.
"O principal vetor (o inseto barbeiro) foi interrompido. A
outra principal forma de transmissão, por transfusão sanguínea, também foi
eliminada, mas ocasionalmente existem novos casos. Uma doença só é considerada
erradicada quando a chance de novas incidências é nula", diz João
Barbosa.
Mesmo assim, já se pode afirmar que o mal tornou-se uma "doença
rara" no país. Ele diz que o contágio vetorial (por diferentes espécies do
inseto barbeiro) foi considerado oficialmente eliminado no Brasil pela OMS em
2006.
A doença também perdeu atenção na mídia brasileira, mas episódios
isolados trazem o assunto de volta ao noticiário ocasionalmente. Em Santa
Catarina, na cidade de Navegantes, 25 pessoas foram infectadas e três morreram
após ingerirem caldo de cana em uma barraca às margens da BR-101 no verão de
2005.
Transfusões
Quanto à transmissão por transfusão sanguínea,
Pinto Dias diz que o Brasil adotou em 1986 uma lei exigindo que todos os bancos
de sangue fizessem testes para detectar a doença. Em 1990, 100% dos hemocentros
já haviam normatizado o procedimento.
"Hoje em dia 0,3% dos doadores
brasileiros são detectados com mal de Chagas. No passado o número chegou a 15%.
Temos de 3 a 4 milhões de transfusões anuais no Brasil e são registrados entre
15 e 20 casos de contaminação por ano desta maneira", diz.
Outra forma de
transmissão da doença citada pelo artigo americano, de mãe para filho, também
está em declínio no Brasil. A idade média das mulheres infectadas está acima dos
40 anos, fora de idade fértil, o que reduz a chance deste tipo de contágio no
país, segundo Pinto Dias.
"A tendência é que o número de mulheres
infectadas diminua gradativamente com o envelhecimento, o que diminuirá cada vez
mais a chance de haver transmissão de mãe para filho".
Fonte: BBC Brasil, 31/05/2012
Nenhum comentário:
Postar um comentário